IV ENCONTRO BAIANO DE EDUCAÇÃO DO CAMPO
Educação do Campo, Agroecologia e Territórios em Disputa: Fortalecendo Novas Primaveras
ISSN – 2525 - 4847
CARTA-MANIFESTO DO II ENCONTRO BAIANO DE EDUCAÇÃO DO CAMPO – ATAQUES DO CONSERVADORISMO E EXPERIÊNCIAS CONTRA-HEGEMÔNICAS EDUCAÇÃO É DIREITO. NÃO É MERCADORIA
Somos educadoras/es pesquisadoras/es, extensionistas das universidades, dos Institutos Federais, das Escolas Família-Agrícolas, da Educação Básica, Escolas Livres de Agroecologia, Estudantes da Educação do Campo, Representantes dos Movimentos Sociais Populares e Sindicais do Campo (MST, MLT, CETA, MPA, MUC, FATRES, FETAG, TEIA DOS POVOS, FUNDO DE PASTO, CONFREM) e Povos Tradicionais, Pescadoras/es reunidos em Salvador, na Universidade do Estado da Bahia, nos dias 15, 16 e 17 de agosto de 2018, no II Encontro Baiano de Educação do Campo: ataques do conservadorismo e experiências contra-hegemônicas, promovido pelo Centro Acadêmico de Educação do Campo e Desenvolvimento Territoral – CAECDT e do Grupo de Pesquisa Educação do Campo – Trabalho, Contra-hegemonia e Emancipação Humana, objetivando reunir os sujeitos da Educação do Campo, com vistas ao aprofundamento de análise da conjutura atual e a socialização das produções acadêmico-científicas e Manifestamos nossa indignação e repúdio contra o acirramento de perdas de direitos sociais duramente conquistados pela classe trabalhadora.
Mediante os debates travados sobre as retrocessos de conquistas históricas que atualmente assolam a maioria da população brasileira, estacamos que além da privação de investimentos públicos nos setores elementares da sociedade (saúde, educação, seguridade dentre outros), através da emenda constitucional, n. 95/2016 verifica-se nas ações do atual governo e nas pautas do congresso parlamentar, avanço da privatização do patrimônio público e o visível alinhamento do atual governo com a centralidade de políticas neoliberais, as quais comprometem desfavoravelmente a garantia do acesso da classe trabalhadora aos bens públicos.
Nesse sentido, denunciamos:
-
A falta de concurso público e a consequente precarização do trabalho docente;
-
Os cortes e contingenciamento de recurso financeiros para as Universidades Estaduais Baianas, e criminalização das ações das/os docentes, gestoras/es e das próprias Universidades e Institutos Federais, colocando em risco a autonomia universitária, compromentendo negativamente a realização de atividades de ensino, pesquisa e extensão e os processos de formação correspondentes;
-
Avanço do agronégocio no campo;
-
Uso abusivo de agrotóxicos e propostas de leis que regularizam esse uso indiscriminado, a exemplo da “PEC do Veneno” (Projeto 6299/2002) – proposta sustentada pela bancada ruralista;
-
Os ataques contra a Educação do Campo, quando do fechamento de escolas e a interferência das grades empresas do agronegócia nas escolas públicas do campo, intervindo na formação e subjetividade das crianças e jovens do campo, no Estado da Bahia. Além de cortes no orçamento do PRONERA, reconhecidamente uma das mais importantes políticas de educação construída nos últimos 20 anos, desde o Golpe vem sofrendo drásticas reduções. Em 2008, quando completou 10 anos, executou um orçamento de R$ 70 milhões. Em 2018, chegou ao ponto mais crítico de sua história, com aporte de apenas 3 milhões de reais, agravado ainda pelo corte de 1,8 milhão antes do final do primeiro semestre, segundo dados do Incra. Não bastasse o desmantelo, há o anúncio de Diretrizes Curriculares do Ensino Médio que determinem a oferta de 40% na carga horária do Ensino Médio e 100% da carga horária da Educação de Jovens e Adultos à distância, bem como que contabilizem as horas de cursos de qualificação profissional e de tempo de trabalho voluntário na carga horária do Ensino Médio e suas modalidades. Estas questões são medidas restritivas ao acesso e permanência com qualidade à Educação Básica em um País no qual apenas a metade da população jovem com idade entre 15 e 17 anos está no Ensino Médio; aproximadamente 20 milhões de pessoas acima de 18 anos não concluíram a Educação Básica; registra um índice médio de 20% de homens e mulheres analfabetas no campo; fechamento de 37 mil escolas no campo nos últimos 10 anos, onde o índice de escolaridade é de, em média, 4,5 anos de escolarização contra 7,8 da cidade.
-
A imposição da Base Nacional Comum Curricular (BNCC) do MEC e sua intencional invisibilização da Educação do Campo, dentro de uma política educacional que propõe “melhorar” a educação brasileira por meio da articulação do ensino às avaliações censitárias (de todas/os as/os estudantes) em escala nacional. A BNCC terá a função de padronizar competências, habilidades e conteúdos de Norte a Sul, determinando o que as escolas devem ensinar e em que tempo. Em vários países onde esta política educacional foi implantada, inclusive nos Estados Unidos, não se observou melhoria nos níveis de educação. No entanto, floresceram tanto a indústria educacional quanto a privatização da educação. Tal medida, somada aos cortes nas bolsas das/os indígenas, quilombolas e pessoas de baixa renda, aos cortes nos recursos gerais das Universidades – em que as/os primeiras/os a serem atingidas/os são as/os estudantes das periferias das cidades e estudantes do campo – indicam um período de fechamento do acesso das classes trabalhadoras do campo e da cidade ao Ensino Superior.
Diante do exposto reivindicamos:
-
Ampliação de cursos de formação docente, no âmito das universidades
-
Garantia e ampliação de orçamento para as universidades
-
Contra o repasse de recursos para as empresas patronais
-
Agricultura camponesa e familiar
-
Criação de um Departamento de Educação do Campo na Secretaria Estadual de Educação;
-
Revogação da Lei 13. 415/2017 de reforma do ensino médio, na sua totalidade;
-
Políticas de enfrentamento do analfabetismo no Campo do Estado baiano
-
A Questão Agrária como componente curricular obrigatório nos currículos das escolas do Ensino Médio do Campo
Ratificamos os compromissos assumidos no CARTA-MANIFESTO 20 ANOS DA EDUCAÇÃO DO CAMPO E DO PRONER, QUAIS SEJAM:
1. Construir a Reforma Agrária Popular, com destinação das terras a quem nela vive, trabalha e a quem está impossibilitado de trabalhar porque delas foi expropriado. Construir a agricultura camponesa como modo de fazer agricultura e de viver das famílias que, tendo acesso à terra e aos recursos naturais que ela suporta, resolvem seus problemas reprodutivos por meio da produção rural, nos seus distintos modos de existência que lhes é própria, seja em relação ao modo de produzir e à vida comunitária, seja na forma de convivência com a natureza;
2. Afirmar a agroecologia como matriz tecnológica, princípio social/pedagógico e projeto de agricultura camponesa/familiar e nosso engajamento com a produção de conhecimento e desenvolvimento da agricultura, da pesca, do extrativismo vegetal a partir da perspectiva da agrobiodiversidade, do agroextrativismo, da segurança e soberania alimentar dos territórios;
3. Lutar pela superação de todas as formas de exploração do trabalho humano e da opressão étnico-racial, cultural, política, de gênero, diversidade geracional, religiosa e de classe;
4. Ratificar os compromissos assumidos pela Conferência Nacional Popular de Educação contidos na Carta da Conferência Nacional Popular de Educação (CONAPE) 2018, reafirmando nossa luta com as/os trabalhadoras/es na defesa da educação pública e gratuita com gestão pública;
5. Reafirmar veementemente que FECHAR ESCOLAS, TURNOS E TURMAS SÃO CRIMES! E nos mobilizarmos permanentemente contra as estratégias de desmantelamento da Educação, as iniciativas do Estado e do setor privado que impeçam o acesso das/os camponesas/es à escola DO campo, NO campo;
6. Combater a privatização da educação pública em todas as suas formas, tanto na formação inicial/continuada quanto na gestão, e seguir na defesa de uma educação pública e gratuita desde a Educação Infantil até a Universidade;
7. Atuar contra as reformas empresariais instituídas por meio da reforma do Ensino Médio e da BNCC e as propostas de transformar EJA e Ensino Médio em Educação à Distância (EaD), que buscam subordinar a Educação Básica às exigências do mercado, reduzindo as dimensões formativas a exames de avaliação contínuos, aprofundando a exclusão;
8. Repudiar veementemente a militarização das escolas e lutar por políticas emancipatórias que visem a superação dos mecanismos de subordinação das/os camponesas/es;
9. Avançar com os princípios da Educação do Campo nas escolas do campo e na formação de educadoras/es. Buscar a construção de uma escola ligada à produção e reprodução da vida, que tome o trabalho socialmente produtivo, a luta social, a organização coletiva, a cultura e a história como matrizes organizadoras do processo formativo, com participação da comunidade e auto-organização de educandas/os e de educadoras/es;
10. Reafirmar a interface entre a Educação do Campo e a Educação Especial, garantindo ingresso, permanência, acessibilidade e inclusão das/os educandas/os com deficiência nas escolas do campo, das águas e das florestas;
11. Fortalecer a luta em defesa do PRONERA e das Licenciaturas em Educação do Campo nas Instituições de
Ensino Superior com as condições necessárias, como moradia estudantil;
12. Lutar pela inserção dos egressos dos Cursos de Licenciatura em Educação do Campo nas escolas do campo por meio de concurso público e editais que contemplem a formação de acordo com as habilitações da Educação do Campo; e
13. Fortalecer a organicidade do FONEC por todo o território nacional, organizando Fóruns, Comitês e Articulações estaduais com representatividade de todos os sujeitos, com princípios e ações de resistência e de luta pelo direito à Educação do Campo, no campo.
Seguiremos lutando. Seguiremos resistindo. Seguiremos estudando. Não só na escolarização básica, limite que a ânsia do lucro dos capitalistas nos reserva. Seguiremos avançando como fizemos nestes últimos vinte anos. Seguiremos nos formando: agrônomas/os; historiadoras/es, advogadas/os, médicas/os, professoras/es e em todos os outros segmentos profissionais que um projeto popular de Reforma Agrária requer. Seguiremos também disputando as Universidades e os Institutos Federais. E nestes faremos não apenas mestrados e doutorados; nós também seremos seus docentes. Como assim já o são dezenas de estudantes nossos que passaram pelo PRONERA. A história nos pertence. A vitória, ainda que demorada, será da classe trabalhadora.
EDUCAÇÃO É DIREITO. NÃO É MERCADORIA.
VIVA A EDUCAÇÃO DO CAMPO e VIVA O PRONERA!
LULA LIVRE!
Salvador, 17 de agosto de 2018.